sábado, 27 de abril de 2013

Emoções

Nasci nos anos 60, do século passado, parece incrível que em apenas cinquenta e poucos anos tanta tecnologia me dê esta sensação de encantamento, surpresa, saudades.
Adorava bibliotecas, os livros arrumados em estantes numeradas, silencio profundo, um cheirinho das paginas amareladas, pessoas sérias, estudantes de óculos fundo de garrafa.
Percorrer as estantes, escolher um livro, folhear, levar  para casa e mergulhar na aventura que devolveria em 15 dias.
Música, escutava num radinho de pilha, numa vitrolinha japonesa portátil ou em fitas K7 engenhosamente gravadas. Muito mais tarde veio o walkman com fone de ouvido. Um verdadeiro luxo.
A rádio era am, Mundial ou JB, gostava de fazer o tipo intelectual e ouvir os clássicos.
Digo isso, porque estou ainda maravilhada com meu Ipad, comprado há quase dois longos anos.
Amiga do face fala num titulo de livro que leu, na mesma hora baixo um ebook e leio também.
A música que acabo de ouvir e achei linda, dois cliques tenho ela nos ouvidos sempre que eu quiser.
Onde fica aquele restaurante, como é o cardápio, entregam em casa?
Dois cliques e um numero de cartão de crédito na mão e meia hora depois saboreio o que tiver vontade.
E eu que já era preguiçosa, não preciso mais sair da cama para saber tudo, ler tudo, escutar tudo e saborear tudo!
Más notícias. Tecnologia engorda.
Más notícias. Tecnologia mata a saudade de amigos distantes mas não substitui longos abraços.
Más notícias. Tecnologia acaba com as surpresas, com a procura, com o medo de se perder nas ruas da cidade.
Más notícias. Tenho tudo nas mãos mas ando enfastiada.
O prazer de descobrir, intuir, fuxicar, andar pelas ruas, pelas filas de estantes apertadas, de torcer para a rádio tocar o que eu queria escutar, telefonar pro novo amor adolescente e torcer pra mãe não estar escutando na outra linha na sala, o fumar escondido, o perigo de ser pego com a boca na botija, o cinema com a turma depois da praia.
Vejo meu filho adolescente. Tudo tão mais fácil e tão insosso!

domingo, 20 de janeiro de 2013

No tempo da minha vó...



Sempre que estou com preguiça, e isso é bem mais frequente do que eu gostaria, eu penso na minha vó.
Vó Zezé, de Minas, metro e meio, magrinha, enrugadinha, cabelinho em coque, vestidinho simples, avental, meias e chinelas.
Doze filhos, sobreviventes.
Quando o almoço, normalmente no domingo, era frango, tinha que levantar com as galinhas, literalmente.
Ir ao quintal correr atrás da galinha mais gorda.
Aí um ritual satânico de torcer pescoço, cortar e deixar o sangue escorrer no prato, isto é que tornava a galinha à cabidela.
Depois depenar a coitada após escaldar na água quente para facilitar o trabalho, uma a uma as peninhas iam saindo.
Passar no fogo para queimar as pequeninas que não se dava conta de arrancar com os dedos.
Cortar os pedaços, retirar as entranhas, limpar e uff... Agora era só ensopar com quiabo, ou fritar na banha quente, ou com o sangue fazer a tal cabidela e com as partes menos nobres, pé, pescoço, asas, fazer  a canja santa que sempre se tinha um doentinho necessitado!
Ah, que delícia, me lembro do gosto daquela comidinha feita lentamente no fogão de lenha.
Hoje preciso atravessar a rua, e pegar uma bandeja amarelinha, com os pedaços de frango cortados e temperados até.
Coloco no forno elétrico, timer avisa quando estiver pronto.
Mesmo assim penso que é melhor ir ali na esquina no restaurante de comida a kilo, pra não ter que lavar louça depois...